DE CASINHOLOS, MALOCAS E MARGINAIS: AS CLASSES PERIGOSAS E SUAS INCÔMODAS MORADIAS NA PORTO ALEGRE DE 1955 A 1975

Luis Stephanou, Rogério Leandro Lima da Silveira

Resumo


O artigo analisa como foi construído o imaginário social e cultural em torno dos processos de urbanização e de segregação espacial, sobretudo no que se relaciona às moradias de classes populares na cidade de Porto Alegre, entre meados dos anos cinquenta e anos setenta, período de intensa urbanização na capital gaúcha. O objetivo é identificar quais eram as percepções que as narrativas da imprensa então revelavam sobre a questão urbana, e compreender como o imaginário sobre a moradia popular influenciava, nessa época, a formatação de políticas públicas na cidade. Metodologicamente, as reflexões e a análise desenvolvidas neste artigo tiveram como principal fonte de pesquisa as edições do jornal Correio do Povo – principal jornal da cidade, nessa época – publicadas entre janeiro de 1955 e dezembro de 1975. Embora o levantamento e análise de dados estejam restritos à cidade de Porto Alegre - RS, entende-se que a construção do imaginário social que ali ocorreu é representativa do que ocorreu e ainda ocorre nos processos de urbanização e de segregação nas demais cidades brasileiras. A construção do imaginário em torno das moradias populares opera um processo de estigmatização de seus moradores. E esta estigmatização é produzida em dois aspectos: por um lado, parte da população é visível como um problema de ordem social e moral. Por outro lado, é invisível na formulação de políticas para a solução deste problema. Assim, os moradores de “vilas de malocas” são, ao mesmo tempo, visíveis e invisibilizados. O artigo evidencia o papel da mídia na construção do imaginário social sobre a urbanização desigual e a centralidade da moradia no debate sobre a questão urbana – algo ainda muito presente, nos dias atuais.

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